De costas para o mundo
A frase que dá nome a esta exposição é uma tradução livre de With my back to the world, título de uma pintura, de 1997, da artista canadense Agnes Martin. O pensamento de Martin acerca da abstração e da subjetividade presentes tanto no fazer artístico quanto no fruir do espectador serviram como ponto de partida para a provocação lançada ao grupo de artistas reunidos nesta mostra. A partir disso, sugeri como pontos centrais o abstrato e a geometria, mas mais do que forma, composição e cor, o desafio estava em pensar na subjetividade da abstração e na capacidade da obra, com elementos mínimos, provocar o olhar a partir de um encontro sensível.
Tomaram forma, então, trabalhos inéditos que percorrem caminhos distintos. Cadeias de montanhas que testam o limite da visibilidade, mapas de mundos imaginários e poéticos, colmeias que são um mundo em si, fotografias que sobrepõem fotografias e testam os limites e capacidades do fazer fotográfico, uma estação de escuta que narra uma história a partir de fragmentos de diversos poetas, cadernos ilegíveis que condensam camadas de um rotina inacessível e joias que remetem a elementos cotidianos que são parte das nossas pequenas meditações pessoais.
Assim, De costas para o mundo procura apontar para um tempo exterior ao mundo, porém interior ao trabalho poético e à subjetividade de cada artista. A liberdade de virar as costas para o cotidiano acelerado que vivemos e nos permitir criar um outro espaço de tempo, onde o fazer se desenrola e o olhar demorado é requisitado e necessário. De costas para o mundo esbarra também em nosso atual momento político, onde por vezes parece preciso afastar-se, olhar de fora, não para alienar-se, mas ao contrário, para encontrar a força sensível que nos permite seguir trabalhando, produzindo e criando de forma crítica.
Esta exposição não é uma exposição que fala de política diretamente. Ela é, para os artistas, um exercício sobre a criação poética e, para o público, uma outra proposição, a de olhar, de experimentar perder-se nos trabalhos, experimentar voltar a suas costas para o mundo para ficar de frente para os trabalhos e encontrar na abstração, seja ela imagem, objeto, som ou puramente pensamento, caminhos para encarar o mundo – sem grandes pretensões, mas sim começando pelo mínimo, por qualquer coisa, pela mínima provocação que uma obra de arte possa vir a provocar. É uma provocação sutil sobre o criar e o olhar.
Luísa Kiefer
Inverno, 2019